Ae pessoal, beleza? Eu sei que todo mundo tem preguiça de vir aqui, mas acreditem ou não, eu venho ver o Blog com certa constância até. o.o"
Bom, eu escrevi um conto, deve estar enorme pra colocar aqui, mas.. Quem quiser leia que eu acho que ficou bacana. Comentários?
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Reflexão
Depois de finalmente chegar em casa ele decidiu que precisava de um tempo sozinho para refletir. Foi caminhando com seu corpo falso, ilusório, e adulto. Nada mais era do que uma versão idealizada de si mesmo, se estivesse vivo. Martin andou pelo cemitério sem pressa, buscando sua tumba não terminada.
Aquele castelo era sua casa. Mesmo que Sora estivesse estranha agora. Ele confiava que sim, era sua família e seu lugar. E o pensamento fazia as coisas menos dolorosas, às vezes.
Passou os olhos nos blocos de pedra ainda crus e sem adorno, e antes de entrar, olhou pra trás. Podia sentir que era observado por outros seres como ele, perdidos na existência. Mas os fantasmas tinham receio de se aproximar; sentiam que o elfo era forte e que sua alma era corrompida. Mais que as deles, ao menos.
Ele sabia que devia conversar. Talvez pudesse ajudá-los, melhorar o lugar, orientá-los em algo. Mas não agora. Agora ele estava confuso sobre seus próprios problemas.
Martin entrou, abrindo com cautela a porta gradeada, fazendo-a ranger. Olhava para o lugar não acabado e apenas com as bases do que seria. Ele fechou a porta, trancou o cadeado, e deitou-se no chão, olhando para cima.
Era um clérigo agora. Tinha responsabilidades. Havia visto o que ocorrera no reino de Glórienn, que havia sido invadido pela Tormenta, o que lhe trazia mais responsabilidades. E, ainda, o servo direto de sua deusa havia dito pouco antes de morrer que a Dama Élfica teve motivos para permitir a permanência dele como um fantasma em Arton.
Sim, dele. Ele era importante, e ela esperava algo grandioso dele. Ele não era como esses elfos tolos por aí que não se importam com sua raça, memórias, descendência, e moram entre humanos, copulando como animais e enchendo Arton de mestiços meio-elfos. Não! Ele sabia o que era melhor pra eles!
Era isso. Ele tinha que usar de todo e qualquer meio para reerguer a nação élfica. Só assim a Dama perdoaria sua tolice. Só assim..
Martin largou o corpo que possuía, flutuando em sua forma etérea acima do mesmo. A coloração semitransparente mudava entre azul, esverdeado, e cinza. Olhava para si mesmo, reflexivo. Seu corpo real não parecia em nada com o elfo carismático que ele idealizava com itens mágicos; era apenas uma criança raquítica.
E continuaria o sendo pela eternidade.
Mas ele se sentia bem.. Era bem melhor estar daquela forma do que ter um corpo. Seu corpo sempre doía. Sempre sentia fome. Sempre sentia cansaço e fraqueza.. Como fantasma, não. Ele se sentia bem. E ele não sentia que precisava se matar, já que estava morto.
O elfo fantasma retira do corpo ao chão o item mágico que lhe fazia parecer outra pessoa, revelando-o. Um garoto humano, maltratado, ferido. Magérrimo. Não era assim antes, mas os corpos não costumavam lhe durar muito; era realmente inconveniente alimentá-los, dar-lhes água, ou cuidar deles. Então Martin usava-os até morrerem. Depois arranjava outro.
O tal garoto, de qual Martin não sabia nem o nome e não se importava em saber, provavelmente era um ladino de rua como ele havia sido. Mas o elfo não tinha pena alguma; os humanos não tinham tido pena dele.. Porque ele haveria de ter pena deles agora?
O garoto olhava o fantasma com uma expressão confusa e sonolenta. Martin retirava de suas vítimas parte de suas vidas, parasitando-os, sugando-lhes o discernimento, a personalidade e o bom-senso. Então ficavam daquela forma, semiconscientes. Mas o elfo não sabia se podiam lembrar ou não do que passaram enquanto eram possuídos e usados como seu corpo, então preferia esperar eles morrerem a liberá-los. Não queria vinganças contra ele depois.
Martin abre um saco com ração de soldado e coloca uma tigela d’água, encorajando o corpo a comer. Por puro desespero de sobrevivência, o garoto comia e bebia água, animalesco.
O fantasma esperava com tédio.
Depois que o garoto já havia comido o suficiente o elfo fantasma colocou as mãos próximas ao corpo, fechando os olhos. Encostava de leve os dedos espectrais, sugando-lhe energia vital. O jovem humano choramingava, o que não atrapalhava o bem-estar que o fantasma sentia naquela forma de alimentação. Aquilo era prazeroso e restaurador, bem mais do que qualquer descanso.
Se forçando a terminar, pois o fantasma tinha que se controlar para não sugar toda a energia (o que mataria o corpo), Martin se coloca novamente a pensar.
Não conseguia desviar mais o foco de sua preocupação. O exército. Os elfos. O balor. E o mais importante de tudo; Ethan, seu irmão, que até um dia atrás ele tinha certeza que estava morto. (Mas morto mesmo, não morto como ele!)
Devia tentar matar o balor para libertar seus servos. E com isso, libertar os elfos.. Ia ter ajuda, com certeza, Glórienn não o deixaria sozinho para tentar libertar mais de seu povo; conseguiria seguidores em Ni-Tamurá, e seguidores na comunidade clerical onde treinara.
Mas.. Ethan estava com eles? Ele estava vivo? Ele estava bem? Ethan tinha procurado por ele?
De inicio Martin preferiu negar; La-Uth devia estar maluco quando disse ter visto Ethan.. Por mais que Martin soubesse que seu irmão tinha uma relação mais forte com ele, não podia negar que para La-Uth, Ethan fora muito tempo um irmão também sendo ambos amigos inseparáveis num passado distante.
Ele lembrou disso, pois nos últimos anos passou a ter flashs de memória. Martin havia soterrado muita coisa de sua infância que estava resgatando só agora: Descobriu, por exemplo, que sua perna esquerda dobrava menos que a direita não por um acidente, como ele achava, mas sim por sua mãe ter batido repetidamente em seu joelho esquerdo certa vez, com uma cadeira, por represália de ele ter faltado em algum compromisso.
“Ela sabia o que era melhor pra mim.” Ele pensava, num suspiro, na verdade tentando não pensar.
Mas, fatalmente, boa parte de sua criação fora obra de Ethan; ele lhe dava roupas, comida, brincava com ele. Ensinou a ler, escrever, começou a ensinar técnicas de espada e arco. Ele comemorou seus aniversários, ele que lhe colocava na cama todas as noites. Ethan que lhe trazia amoras pelo menos uma vez por semana, dos campos próximos a Lenórienn. Ele que havia lhe dado sua adaga élfica, sua coisa mais preciosa em vida.
O que Ethan pensaria se soubesse os rumos que Martin havia tomado? Que estava matando gente? Que era um fantasma corrompido? Que havia se matado por causa de uma humana idiota?
Não, ele não podia saber! Martin ia salvar Ethan, com certeza, mas sem deixá-lo saber de sua real natureza. Dessa forma, tudo continuaria como antes.. Tudo ficaria bem, até melhor, e ele ia ser querido novamente. Por sua nova família, sua nova mãe, seu novo irmão.. E por ele, Ethan. E por La-Uth. Sim, ele ia ser feliz! E por fim, ia reconstruir a nação élfica! Ia dar tudo certo!
Glórienn fizera ele e La-Uth reencontrarem Ethan. Só podia ser, como um presente pelos esforços do elfo, como ele não tinha percebido? Sua Dama Élfica era boa, e ela o amava. E como Ethan podia censurar Martin se tudo que ele estava fazendo era para o bem da raça deles?
Martin retira das vestes do humano alucinado um símbolo de ouro; um arco se cruzando com uma espada. O símbolo da deusa dos elfos, Glórienn. Ele pega o objeto nas mãos e acaricia, sorrindo de leve, perturbado.
“Glórienn, Glórienn.... Glórienn..”
Evocando chamas negras em ambas mãos, que envolviam o objeto, ele fecha os olhos. Estava com as mãos em prece e deixava as chamas lhe queimarem, ferindo-o, deformando e escurecendo o ectoplasma que compunha suas mãos e braços.
“Aceite minha dor, minha deusa! Aceite minha dor como demonstração da minha fidelidade por ti, como punição aos meus infinitos pecados, e como gratidão à minha Dama de continuar me agraciando e olhando por mim mesmo sabendo de toda a minha podridão..”
Ele leva os olhos negros cheios de trevas para o alto.
Tentava mais ou menos basear suas ações nas de Tobi, o religioso de seu grupo de aventureiros, e quem indiretamente o havia inspirado a seguir o clericato.
“Não irei te decepcionar!”
Finalmente extinguindo as chamas, o elfo passa alguns segundos analisando, com uma expressão infantil, as mãos e braços meio derretidos.
Doía muito.
E isso era bom. A dor física aliviava a dor em seu peito, mesmo que ele não tivesse mais um coração.
E quanto mais se sofre, mais você mostra que realmente se importa com algo, certo?
Neither in the dark, neither in the light. We write our stories covered by shades.
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